terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A Sardinha e o Cherne

Poderão os leitores desprevenidos, pensar que aqui se iniciará uma fábula, daquelas, à la Fonteine, em que a sardinha encontra o cherne, ou o cherne encontra a sardinha, e o cherne e a sardinha certamente ao se encontrarem dirão algo um ao outro, nada estranho numa fábula, com elevada carga moral, mas, meus caros leitores, não é de certo uma fábula de que isto se trata.
Passa-se algo comigo, uma dicotomia engraçada, talvez não tão engraçada como a palavra dicotomia, que pode resumir-se ao facto de os meus dois peixes favoritos serem a sardinha e o cherne.
Os mais perspicazes perceberam já a minha intenção ao revelar tal aspecto da minha personalidade. Os outros, bom os outros com sorte, hão-de lá chegar.
Ora, de um lado temos a sardinha, brejeira, descarada, vadia, bairrista, que fica perfeita em cima de um pão, metáforas à parte. Do outro temos o cherne, elitista, requintado, de aspecto fino e delicado. E ambos não se misturam. A sardinha lá fica no seu bairro, na Madragoa, na festa de verão, e o cherne, esse, por certo não o apanharão numa tasca.
Analisadas bem as coisas, num acto introspecção que me aconselhou Maria Helena Martins na previsão para o mês de Janeiro, posso afirmar, sem dúvida alguma, ou talvez com uma ou duas, que estas minhas preferências, revelam com grande precisão a essência da minha personalidade. Também eu sou brejeira e descarada, e também eu sou, dependendo é claro do dia, requintada! O meu problema é que ao contrário da sardinha e do cherne, as minhas várias características…confundem-se. E então não é raro verem-me comportar como uma sardinha num local em que devia comportar-me como um cherne, e vice-versa.
E, se por um lado acho que faria melhor ao tentar equilibrar estas minhas duas facetas, por outro sinto-me uma espécie de rebelde sem causa, um James Dean no feminino, a mandar às urtigas as convenções sociais.
Para dizer a verdade, só ficarei um dia contente, quando ao jantar num restaurante mais fino, o garçon, elegante no seu pappillon e com o guardanapo no antebraço, me diga, numa voz ponderada, que a especialidade é...sardinha assada, ou quando no verão em plena romaria de noite de santos populares, me tentem vender por um euro e meio uma fatia de pão com cherne.

8 comentários:

Cath disse...

Tal e qual, Inês... tal e qual! Eu cá prefiro cherne com molho de mostarda servido numa tasca na lapa ;)

Catarina disse...

...e o que para alguns se confunde com fábulas, para outros é uma reflexão da vida. isn't it? :)

ZdT disse...

Pequenina como a sardinha, mas com um toque inconfundível de requinte. Até ver, está tudo como se quer =)

Anónimo disse...

Adorei o uso da terminologia piscícola! lol

Segismundo disse...

E já dizia o Alexandre O'Neill "sigamos o cherne, minha amiga!".

PS - as Bolachas têm um gosto musical que vai lá vai. A rubrica (termo muito onda FM) 'dentro do frasco' vai muito bem.

Inês Rubio disse...

Aahhh...estas observações estão-me a saber ainda melhor que uma dose e meia de sardinha assada :D *

Ookami disse...

Não conheço, não sei, mas dá para perceber que se trata de uma sardinha de classe, que apesar de tudo, se destaca do cardume...

ZdT disse...

Agora temos folk(lore) erudito? ahah!