quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Ano Novo

Arrumo as gavetas na esperança de arrumar as ideias, alinhar os chakras, pôr ordem no feng shui. Mas as gavetas são mais fáceis de arrumar que a desordem das ideias, o caos dos pensamentos. Deito fora papéis de rebuçados, pacotes de açúcar coçados, guardanapos com desenhos, no mínimo estranhos, memórias de coisas das quais já não me lembro. Lembranças de outras aventuras, para as quais não há bibelôs ou souvenirs que as valham, essas, permanecem cá dentro. Sacudo o pó dos móveis na tentativa de com cada pequena partícula voem também, para não mais voltarem, os sentimentos de culpa, as inseguranças e os medos que como bolas de cotão se nos vão prendendo ao corpo. Faço a cama de lavado. Como se a frescura da almofada e cheiro a sabão tradicional, se transmitisse por osmose directamente para dentro da minha cabeça. Tiro de cima da mesa da cabeceira, demorando-me no pormenor das capas, todos os livros que ali se acumularam ao longo do ano. Outros hão-de adorná-la no ano que vem. Alinho as roupas no roupeiro. Endireito os casacos e as calças nos cabides o melhor que posso sem roçar o neurótico.
Aproveito-me, sem vergonha, da ideia romântica e que com um novo ano começará um novo ciclo, uma nova fase, enfim, algo de novo.
E ninguém quer começar o quer que seja com o quarto por arrumar.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Fazemos uma pequena pausa nas rabanadas e damos tréguas às azevias. Saímos por momentos debaixo das mantas polares e de perto dos familiares, para desejar a todos aqueles que escaparam ilesos à 200ª transmissão do filme “Sozinho em Casa” um óptimo dia…afinal, dizem que é Natal.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Esqueci-me que era dia e adormeci.
Esqueci-me que era noite e acordei.
Nas minhas recordações permanece parte de ti, como uma fotografia desfocada. Foste com o vento que vem do sul. Vento raro. E eu sem mãos para te agarrar. O desconforto de já não me lembrar da tua voz, é pior que a angústia de algum dia te voltar a ver.
Esqueci-me que eras importante e perdi-te.
E tu ainda te lembras de mim?

domingo, 20 de dezembro de 2009

Frio & Programas de Natal para todos nós

Estou rodeada de lenços de papel por todos os lados. Grande parte deles usados. O gato preto com nome de cantor africano dormita enroscado em si próprio, sem que a desarrumação pareça preocupá-lo.
Na mesinha de cabeceira amontoam-se os remédios milagrosos que prometem fazer com que pare de tossir, de espirrar e com alguma sorte impedirão que mais lenços se juntem aos outros.
Está um frio gelado que ameaça tornar-me as mãos em dois glaciares se continuar a insistir em escrever estas linhas.
Do andar debaixo sobem distorcidas as músicas dos programas dedicados à época Natalícia. Apresentadores sedentos de solidariedade e alegria e amor, acompanhados pelas grandes estrelas da constelação musical portuguesa, chamam o público sénior a abanar a cabeça para um lado e para o outro, e enquanto este canta sua própria versão da música "White Crhistmas” bailarinas sorridentes de fatos brilhantes feitos à medida desafiam o frio entre piruetas bem ensaiadas.
É claro que não sei precisar nada disto, enfiada que estou entre mantas polares, mas se me permitem sinto-me, do alto da minha experiência de fins-de-semana pré natalícios, no direito de adivinhar. Além disso podia jurar que acabei de ouvir uma voz trémula dizer que no tempo do Salazar não fazia tanto frio pelo que mantenho a minha versão.
A verdade é que não é uma boa altura para se ficar doente, esta. Nem um bom sítio. Aqui de Inverno faz tanto frio como no Verão faz calor, um calor sufocante. Mas se me perguntassem neste momento o que preferia eu, de nariz vermelho responderia sem dúvidas e em voz nasalada, venham de lá esses 40º graus à sombra! Ou não, que eu até sou pessoa para gostar do Inverno. E agora se me dão licença vou ali tomar mais um comprimido e preparar-me para emoções fortes. Este deve ser dos bons, se bem me recordo no folheto informativo referiam possibilidade de alucinações.